Lusofonia e Política de Língua

Lusofonia e Política de Língua

 

Já diz o ditado “palavras leva-as o vento” é o que me faz pensar a sequência disruptiva de diplomas que imanam da Assembleia da República, nem a mudança de século provoca uma mudança de paradigma no que concerne ao planeamento de uma política de língua em Portugal. Como todos nós sabemos não é só necessário dizer que a “promoção da língua” (R.C.M n.º 188/2008) internacionalmente é um dos vectores da acção da diplomacia portuguesa para que a situação no terreno melhore. É mesmo costumeiro da acção política criar resoluções, leis, propaganda perto do calendário eleitoral. Falta a Portugal uma visão que comande a mão em vez de a visão ver e a mão estar dormente. Escrevo por razões pessoais falta um pouco de tudo na organização da “promoção da língua”. O que existe é mais devido aos cidadãos anónimos, que colocam os filhos nas escolas portuguesas, que fazem rádios, escrevem jornais, fazem blogs, que não têm vergonha de falar português nos cafés da Inglaterra, França, Suíça... a eles se deve a “promoção da língua”. Que apoio têm estes cidadãos que muitas vezes esperam horas nas filas dos consulados, que lhes vêm negados direitos iguais no desconto do Irs, na reforma, apesar de como se sabe contribuírem com milhões para a economia portuguesa todos os anos.

A “promoção da língua” é a promoção do homem e da mulher, eles é que a usam, eles é que a escolhem, se lhes tirarem direitos, se em vez de existir o diálogo e a diplomacia lhes forem apresentados obstáculos pois escolherão outra língua para os seus filhos, netos, e depois é irremediável, perdendo os falantes empobrece-se a língua.

 

Assistimos a mudanças sucessivas de leis, presentemente vive-se uma passagem da tutela do Ensino do Português no Estrangeiro do Ministério da Educação para o Ministério dos Negócios Estrangeiros, no qual o Instituto Camões será o responsável directo pela prossecução da “promoção da língua”, será um retrocesso ou um avanço? Interpretando as palavras da Resolução do Concelho de Ministros de 2008, “Considera-se igualmente importante encontrar soluções abertas, de geometria variável, para o ensino do Português no estrangeiro, consoante a natureza da procura e do público que se pretende atingir. Para além da integração curricular do ensino da Língua Portuguesa, a constituição de centros de ensino da língua e cultura portuguesa permitirá alargar a oferta e responder a uma procura diversificada. Onde não for possível ou não se justificar a constituição de centros próprios, deverão ser estabelecidos protocolos com centros de língua existentes tendo em vista o ensino do Português”, encontramos tanta mudança num só paragráfo que é preciso ler com mais calma e analisar objectivo a objectivo.

 

A ideia é integrar os cursos nos sistemas de ensino de cada país. Concordo plenamente com esta possibilidade porque seria universalizar a oportunidade de aceder aos cursos da Língua Portuguesa. Já criar centros de ensino da língua e cultura portuguesa ou criar protocolos com centros de língua, penso que é continuar com a rede actual de ensino, o que já é substancial. Mas o que não está explicito é se fecham ou não os actuais cursos de ensino da língua portuguesa, o que parece improvável mas não é impossível, como noticiou o jornal Público citando a agência Lusa,

Na semana passada, a presidente do IC, que assumiu recentemente a política de promoção da língua, admitiu que o ensino do português enquanto língua materna pode acabar em alguns países porque o objectivo é a sua integração nos sistemas de ensino no estrangeiro.”, como já referi a integração é ótima mas se os países de acolhimento de emigrantes portugueses, como a Suíça, não estiverem dispostos a avançar para os cursos integrados no país inteiro, apesar de já ocorrer no cantão de Zurique, abandonar-se-ão as restantes comunidades? O mesmo jornal refere que as comunidades estão “deveras” preocupadas com o fim de alguns cursos de língua materna. Estas ondas de incerteza não beneficiam em nada a “promoção da língua”. Resumindo, falta esclarecimento, nem os próprios actores educativos conhecem o futuro a curto prazo. O planeamento deveria prevenir esta incerteza, e como já foi afirmado, não é por se escrever no papel que a “promoção da língua” acontece.

Promover a língua é uma tarefa enorme, existem quase 75.000 alunos no estrangeiro contabilizados pelo DEB, espalhados por todos continentes do Mundo. Só o orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros subiu mais de 46 milhões de euros devido à mudança da tutela (LUSA). Como se costuma dizer, “metemos todos os ovos no mesmo saco”, oxalá não deixem cair o saco ao chão. Fora do “saco” ficaram as associações de emigrantes, os centros portugueses de fim-de-semana onde se organizam as festas populares, se grita “é golo!”, se cantam os parabéns e o hino também. Por ser uma tarefa enorme é preciso abraçar as organizações como o IILP, a UCCLA, a AULP, sem esqueçer as rádios locais, os jornais, as associações de pais, porque todos podem contribuir para “promover a língua”. Deixá-los de fora das negociações, deixar a cortina fechada é não entender que a política se faz com as pessoas, não se faz contra as pessoas.

Em conclusão Portugal teve durante anos medidas avulsas, disruptivas com as “políticas de língua” dos governos anteriores. Não existe um planeamento linguístico aberto e divulgado, porque as comunidades expressão o desconhecimento da “política de língua”. Por fim, as instituições estão desconectadas, uma com a totalidade do investimento e as outras dependentes de financiamento próprio.

 

Bibliografia

 

 

LUSA. “Orçamento do Estado para 2010” in Público. Disponível em:

http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1419877 , consultado em 8 de Fevereiro de 2010.

 

LUSA. “Emigrantes “deveras” preocupados com eventual fim do ensino de Português como língua materna” in Público. Disponível em: http://www.publico.pt/Sociedade/emigrantes-deveras-preocupados-com-eventual-fim-do-ensino-de-portugues-como-lingua-materna_1419760 . Consultado a 8 de Fevereiro de 2010.

 

LUSA. “Ensino do português enquanto língua materna pode acabar em alguns países”. In Público. Disponível em: http://www.publico.pt/Educa%C3%A7%C3%A3o/ensino-do-portugues-enquanto-lingua-materna-pode-acabar-em-alguns-paises_1418057 . Consultado a 8 de Fevereiro de 2010.

 

 

MÁRIO, Filipe (2004). “Promoção da Língua Portuguesa no Mundo (que) Modelo Estratégico(?) ”.Universidade Aberta.

 

PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS. “Resolução do Concelho de Ministros 188/2008”. Disponível no Diário da República, 1.ª série — N.º 231 — 27 de Novembro de 2008.