O que diz o Programa de Governo sobre a Escola Pública - Parte II - Resumo Completo

O que diz o Programa de Governo sobre a Escola Pública - Parte II - Resumo Completo

O "Programa do XXIV Governo de Portugal na área da Educação" parte à procura de entendimentos e faz uso de alguns lugares comuns entre as diferentes ideologias dos principais partidos da Assembleia da República, como é visivel na afirmação inicial, "Um País mais rico, inovador e competitivo, que investe na educação, na ciência, na tecnologia e na cultura, que estimula a criatividade e o empreendedorismo, que valoriza o tecido produtivo nacional e que reforça a sua capacidade exportadora e a sua integração nas cadeias de valor globais." (p. 6). As referências ao desporto, à educação inclusiva e a introdução de temas como a "corrupção" nos currículos, são outros exemplos desse entendimento alargado que o Governo procura na área da Educação.

O Programa de Governo, ainda no texto introdutório, indica que ao nível do desporto pretende "clarificar competências e potenciar sinergias entre a educação física, o desporto na escola (todos os níveis de ensino), o desporto no clube, as atividades de recreio desportivo de cariz comunitário e o desporto para segmentos populacionais específicos" (p.16), e ainda, "alargar a representação no Conselho Nacional do Desporto ao Conselho Nacional de Associações de Profissionais de Educação Física e Desporto e à Sociedade Portuguesa de Educação Física, de modo a reforçar o papel da disciplina e dos docentes de Educação Física no debate das políticas públicas para o Desporto." (p. 16)

Revestido de um cariz de inovador e de Nova Gestão Pública encontramos referências à Educação Inclusiva nas primeiras preocupações do Governo, como se observa na directiva de "Fomentar a educação inclusiva desde idade precoce, nomeadamente através do reforço dos meios e recursos afetos às ELI (Equipas Locais de Intervenção), que certifique que todos os alunos tenham acesso ao currículo e a materiais adaptados e progridem nas aprendizagens, em contexto de turma; que assegure que a formação de professores contempla a deficiência e a diferenciação pedagógica; que garanta a inclusão de todos os alunos na ETI, independentemente da sua situação pessoal e social e que garanta que escolas públicas têm professores de ensino especial em número suficiente e que as escolas privadas devem ter qualquer apoio dependente da demonstração da existência de alunos com NEE devidamente apoiados por professores especializados" (p. 32), e ainda, a menção da inclusão de conteúdos curriculares sobre a prevenção e o combate à corrupção, nos diferentes níveis de ensino, e  "divulgar as boas práticas e os casos de sucesso na prevenção e no combate à corrupção, reconhecendo e valorizando os exemplos de transparência e de integridade, e incentivando a replicação e a disseminação dessas melhores práticas."(p.83).

7.1. Educação e Formação Um País define-se pela Educação e a Educação é definidora de um País. (pp.103-111)

 O Estado tem responsabilidades em garantir não apenas a democratização da educação através de um ensino universal, obrigatório e gratuito, como também em assegurar o direito à igualdade de oportunidades de acesso a uma educação de elevada qualidade, que permita aos alunos ter êxito escolar ao longo dos diferentes níveis educativos. No ano em que se assinala o 50º aniversário do 25 de Abril, constata-se um retrocesso que urge inverter e recuperar. A degradação da aprendizagem, o conflito e a instabilidade social nas escolas e a escassez de professores constituem um cenário que gera enorme preocupação a toda a comunidade educativa e que não pode ser ignorada pelos agentes políticos. Esta degradação afeta sobretudo as famílias mais desfavorecidas, pondo em causa o direito constitucional à igualdade de oportunidades. Há uma geração de alunos a ficar para trás e que precisa, urgentemente, de uma educação que lhe dê futuro. A falta de soluções reformistas nos últimos anos, num contexto de envelhecimento do corpo docente e escassez de professores, prejudicou o funcionamento das escolas e a aprendizagem dos alunos, resultando em elevados índices de stress para os professores. É imperativo encontrar uma resposta às justas reivindicações dos professores. Uma situação que era antecipável no tempo transformou-se, pela falta de ação, num problema com contornos graves e urgentes, pelo que o Governo preconiza um programa de valorização da profissão de professor e a atração de novos profissionais. É urgente devolver à Educação e à Escola Pública a serenidade, o rigor, e o planeamento de que necessitam para garantir uma educação de qualidade.

 Os efeitos das políticas seguidas nos últimos anos foram visíveis em várias avaliações internacionais de referência, nomeadamente no PISA 2022, onde se observou uma queda dos resultados dos alunos portugueses superior à queda média da OCDE. Esta degradação em relação aos bons resultados do PISA 2015 reflete as políticas erradas dos últimos anos. Falhou a recuperação da aprendizagem, falhou o rumo dado às alterações curriculares, falhou a avaliação, falhou a transformação digital e falhou o modelo de provas de aferição instituído em 2016. A garantia de uma educação de qualidade, acessível a todos, requer uma clarificação das competências e obrigações do Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) e dos seus serviços e, por outro lado, as atribuições e competências das escolas e das suas direções, bem como das autarquias. De facto, o processo de descentralização na área da educação carece ainda de ser aperfeiçoado, nomeadamente ao nível da definição das competências e dos recursos das direções das escolas e da sua articulação com as Direções Gerais do MECI. O Estado deve providenciar os meios necessários às escolas. As escolas devem ser dotadas de autonomia na sua gestão de forma a assegurarem as condições técnicas e pedagógicas para uma educação de qualidade em igualdade de oportunidades para todas as famílias, em todo o território nacional. O aumento da imigração nos últimos anos e do número de filhos de imigrantes, oriundos de geografias muito diversas, a frequentar as escolas gerou o enorme desafio ao nível do acesso e do sucesso escolar, condição necessária para a sua boa integração na sociedade e no mercado de trabalho. Num contexto de tão rápidas mudanças sociais, tecnológicas e culturais, a Educação precisa de um rumo firme que, num contexto de grande mudança e incerteza, se concentre nos pilares do desenvolvimento humano: o conhecimento, a cultura e os valores de cidadania. Para tal, o Governo apresenta os seguintes compromissos:

7.1.1. Aprender Mais: Recuperar a aprendizagem e não deixar alunos para trás

  • Implementar o A+A, “Aprender Mais Agora”, um plano de recuperação da aprendizagem que realmente permita aos alunos construir um caminho de sucesso escolar. O A+A incluirá recursos adequados para o apoio aos alunos nas escolas, a capacitação de docentes para implementar um sistema de tutorias, assim como o reforço de créditos horários e o investimento em recursos educativos digitais de apoio ao estudo;
  • Aprofundar a autonomia dos agrupamentos TEIP e majorar o seu financiamento, com avaliação e prestação de contas, para fomentar projetos de maior integração e igualdade de oportunidades.

7.1.2. Modernizar o sistema educativo

  • Em diálogo com a Assembleia da República, contribuir para a revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo de 1986, alinhando-a com os desafios do século XXI;
  • Redefinir o papel do Ministério da Educação, Ciência e Inovação atribuindo responsabilidades de regulador e não de decisor sobre o funcionamento de todas as escolas públicas; · Reestruturar os ciclos do ensino básico, integrando os 1º e 2º ciclos, de forma a alinhar com a tendência internacional e garantir uma maior continuidade nas abordagens e um desenvolvimento integral dos alunos;
  • Alargar o âmbito e promover maiores níveis de transparência e de acesso público aos dados estatísticos de monotorização do sistema educativo;
  • Incentivar a implementação de práticas educativas interdisciplinares, realizadas ao ar livre, em espaços verdes e em contacto com a natureza; 106
  • Melhorar a eficiência, criando uma plataforma integrada de todos os serviços do Ministério da Educação, Ciência e Inovação e investindo em recursos digitais que simplifiquem os processos administrativos.

7.1.3. Começar Cedo: a educação dos 0 aos 6 anos de idade

  • Integrar a faixa etária dos 0 aos 3 anos no sistema educativo tutelado pelo Ministério da Educação, Ciência e Inovação;
  • Acesso universal e gratuito: alargar a oferta pública e sem custos para as famílias de creche e de pré-escolar, seja aumentando a capacidade da oferta do Estado, seja contratualizando com o sector social, particular e cooperativo, seja promovendo soluções transitórias, em articulação com os municípios e a sociedade civil, nos contextos onde a oferta instalada não seja suficiente para suprir a procura de vagas;
  • Produzir e difundir orientações para o período 0-6 anos e proporcionar às instituições o acesso a materiais educativos adequados ao desenvolvimento nas áreas das linguagens (oral, escrita, artísticas e digitais), da matemática, das ciências e da motricidade;
  • Reforçar a formação inicial e contínua de Educadores que trabalhem com crianças de 0-3 anos, assim como a formação de Auxiliares de Ação Educativa.

 7.1.4. Um currículo exigente e flexível para desafios imprevisíveis

  • Desenvolver um currículo centrado no conhecimento científico e cultural, revendo as “Aprendizagens Essenciais” e os documentos orientadores do ensino, elevando as expectativas em relação à aprendizagem dos alunos;
  • Iniciar uma revisão curricular no sentido de flexibilizar as cargas letivas obrigatórias nos vários níveis de escolaridade do Ensino Básico, de incluir o ensino do inglês desde o 1.º ano de escolaridade, de introduzir a coadjuvação na Educação Física no 1º ciclo, e de reforçar o ensino experimental das Ciências;
  • Redefinir os percursos científico-humanísticos do ensino secundário, no sentido de alargar as disciplinas que os alunos podem livremente escolher frequentar, alargando posteriormente esta possibilidade aos alunos do 3º ciclo do Ensino Básico.

7.1.5. Confiar nas escolas públicas: mais autonomia para gerir e ensinar

  • Melhorar o sistema de transferência de competências para as Autarquias, articuladamente com as escolas;
  • Clarificar as competências do MECI, das escolas e das suas direções;
  • Estabelecer o estatuto do diretor de escola, que inclua um modelo especial de remuneração e de avaliação;
  • Construir, em diálogo com os diretores e professores, um novo modelo de autonomia e gestão das escolas, que robusteça a autonomia financeira, pedagógica e de gestão de recursos humanos das escolas;
  • Atualizar o financiamento e rever a regulamentação das Atividades de Enriquecimento Curricular (AEC);
  • Redefinir os parâmetros técnicos de construção e reabilitação dos edifícios escolares. 7.1.6. Monitorizar a aprendizagem: uma avaliação rigorosa
  • Implementar provas de aferição a Português, Matemática e uma disciplina rotativa (a cada 3 anos) nos 4.º e 6.º anos (anos de final de ciclo), de aplicação universal e obrigatória, substituindo as provas de aferição atualmente em vigor;
  • Publicar os resultados das provas de aferição em tempo útil, a nível nacional e de agrupamento, para fins de identificação de fragilidades no sistema educativo, prestação de contas e valorização das provas;
  • Rever a aplicação do atual modelo de avaliação das aprendizagens (vulgo aplicação do projeto MAIA).

 7.1.7. Uma educação para todos

  • Avaliar o impacto do atual Regime Jurídico da Educação Inclusiva;
  • Rever o modelo de financiamento dos apoios técnicos especializados em meio escolar;
  • Melhorar a inclusão de pais e encarregados de educação dos alunos com medidas adicionais nos processos de decisão e escolha do percurso escolar dos seus educandos;
  • Melhorar as estratégias de transição para a vida ativa;
  • Reforçar os meios para o ensino do «Português Língua Não Materna», considerando o aumento do número de estudantes cuja língua materna não é o português;
  • Monitorizar resultados escolares daqueles estudantes e definir estratégias para o seu sucesso escolar, de forma a garantir a sua integração plena na sociedade e no mercado de trabalho;

7.1.8. Combater as desigualdades sociais

  • Avaliar o aumento da dotação para a Ação Social Escolar;
  • Ponderar o aumento dos valores de comparticipação do Material Escolar e do Valor Máximo atribuído para as Visitas de Estudo;
  • Melhorar o sistema de apoio às famílias carenciadas que frequentam o ensino particular e cooperativo;
  • Combater a segregação social entre escolas, avaliando as regras de prioridade nas matrículas, impondo transparência no processo de alocação dos alunos e publicando as áreas de influência geográfica das escolas da rede pública.

7.1.9. Diversidade e liberdade para aprender

  • Promover uma rede de escolas de ensino artístico especializado de música, dança e teatro; · Melhorar o modelo de Contrato de Patrocínio, destinado a financiar os estabelecimentos de Ensino Artístico Especializado;
  • Implementar um programa de sensibilização para características e mais-valias do ensino profissional, para melhor informação dos alunos;
  • Otimizar a rede de oferta de ensino profissional e melhorar o seu modelo de financiamento.

7.1.10. Reconhecer a importância dos Professores

  • Iniciar a recuperação integral do tempo de serviço perdido dos professores, a ser implementada ao longo da Legislatura, à razão de 20% ao ano;
  • Criar uma dedução em sede de IRS das despesas de alojamento dos professores que se encontrem deslocados a mais de 70 km da sua área de residência;
  • Criar incentivos para a fixação de docentes em zonas de baixa densidade ou onde há falta de professores, como acontece atualmente na região de Lisboa e Vale do Tejo e no Algarve;
  • Desburocratizar o trabalho dos professores, dando-lhes autonomia, autoridade e melhores condições e tempo para educar e apoiar os alunos;
  • Adequar a formação contínua às necessidades de professores e escolas, valorizando a autonomia das escolas na elaboração dos seus planos de formação;
  • Construir, em diálogo com os professores, um referencial para a Avaliação do Desempenho Docente;
  • Alterar o modelo de colocação de docentes, de modo a ter em consideração outros fatores, como a residência e avaliação, garantindo equidade, adaptabilidade, eficiência e eficácia;

7.1.11. Um programa de emergência para atrair novos Professores

  • Promover uma campanha nacional de sensibilização para a importância dos professores, para incentivar mais jovens a escolher esta profissão;
  • Promover as horas extra dos professores, de forma temporária e facultativa;
  • Promover o regresso ao ensino dos professores que tenham saído da profissão, através de mecanismos de bonificação de reposicionamento na carreira;
  • Rever o salário em início de carreira docente e rever os restantes índices e escalões, no sentido de simplificar o sistema remuneratório;
  • Adequar a formação inicial de professores, em linha com as necessidades do sistema educativo.